Por Amanda Lahmann*
Às vésperas de completar dois anos de pandemia, já que o estado de emergência sanitária foi decretado no Brasil em 4 de fevereiro de 2020, um mês antes da Organização Mundial de Saúde (OMS) anunciar o elevado estado de contaminação do vírus Sars-Cov-2, chegou a hora de nos unirmos para, a partir do aprendizado acumulado, alavancar a experiência e tornar a indústria de eventos, feiras e exposições sustentável.
Para começar, nós precisamos reconhecer o quanto aprendemos sobre interação humana e sobre organização de eventos neste período. A COVID-19 exigiu de cada um de nós um grau de reinvenção que não imaginávamos ser capazes. Nós, gestores de eventos, tivemos que desaprender e aprender um novo modus operandis, desde o planejamento até a mensuração dos resultados.
De repente, em vez dos estandes, palcos das feiras e congressos, deparamo-nos com estúdios de gravação e nossos eventos se transformaram em programas de televisão. Aprendemos a fazer roteiros detalhados, com marcações diferentes daqueles a que estávamos acostumados, pois o evento virtual tem necessidades e oportunidades distintas do presencial. Ensaios e mais ensaios são precisos. Afinal, não é fácil falar sem plateia!
E, assim, o modelo híbrido chegou – e vai ficar. Ele não tira nem desmerece a importância do presencial, que cria mais proximidade com as pessoas, afinal somos seres sociais, precisamos desse contato cara a cara. A tela “quebra o galho” (e como!), mas não é igual. Às vezes, o que foi dito em uma gravação não é tão bem absorvido e entendido como o “olho no olho”.
É claro que, dentro desse processo de reinvenção, os custos também mudaram. Um evento virtual não necessariamente é mais barato - tudo depende da programação. Para obter o resultado desejado, a preparação é algo importantíssimo e aporta criatividade e previsibilidade a budgets cada vez mais enxutos.
A inovação passou a permear todo o processo. E, quando falo em inovação, não me refiro a descartar o antigo e implantar algo disruptivo, do zero. Prefiro a abordagem do pensador austríaco Joseph Schumpeter, criador do conceito de “destruição criativa”, que aposta em uma nova combinação de algo já existente. E este é o apelo que faço nesta carta.
Fico animada ao ver o setor renascendo, com o avanço da vacinação. Shows, espetáculos e casamentos começaram a ser remarcados e já lotam casas, buffets e outros espaços no Brasil. A indústria de Feiras & Congressos, uma das mais prejudicadas com a pandemia, também aquece os motores. Quem tentou agendar um evento sabe bem disso. Centro de convenções e hotéis já não dispõe de datas disponíveis.
Pergunto: além de protocolos de segurança sanitária repaginados, o que mais estamos propondo de diferente ao público?
Nos bastidores, a comercialização de feiras e congressos, não apresenta inovação. Os processos de comercialização dos eventos estão iguais, parece que nada aconteceu, nada mudou, nada se aprendeu. Os patrocinadores/expositores continuam sendo tratados com pouca empatia. A única mudança percebida foram os preços. Com o aumento da inflação, principalmente energia e combustíveis, o impacto foi enorme, os valores não são mais os mesmos.
Para os gestores de eventos, a cobrança por respostas também aumentou. Do controle do budget, ao planejamento somos cobrados.
Como profissionais de eventos contratantes, até entendemos que imprevistos acontecem, mas antigos gargalos da indústria de Feiras & Congressos ficam cada vez mais difíceis de serem explicados dentro de nossas corporações. Este é o caso das taxas de montagem de um estande, de limpeza a crachás tudo é cobrado à parte, sendo a taxa de uso de energia (KVA) o mais sensível de todos.
O KVA (Quilovolt - Ampere) nada mais é que a energia que chega no estande. Ela não faz parte do pacote, e seu valor não é informado durante a comercialização do evento. Cai como uma surpresa indigesta, uma bomba relógio. Exagero? Bem, no meu caso, não. Eu já tive que pagar por três dias de evento um valor superior ao consumo mensal de uma fábrica. Como justificar esse valor para a corporação?
Eu nunca encontrei uma explicação plausível desta cobrança. Também não consigo entender o motivo pelo qual esses custos não são absorvidos pelos organizadores ou incluídos no valor do m2 como acontece no exterior. Sim, o valor que os expositores pagam pelo metro quadrado já é alto, mas receber um “boleto surpresa” depois é muito pior do que já ter este custo incluído desde o início. Em um momento de reinvenção, em que eventos virtuais e proprietários se firmaram como estratégias válidas e mais relevantes para atrair e engajar clientes, esses custos adicionais, completamente anômalos em feiras e congressos, vão levar os investimentos cada vez mais para o outro lado.
O propósito desta carta, porém, não é distribuir acusações nem apontar dedos – pelo contrário. Faço aqui um convite para organizadores, centros de convenções, patrocinadores e expositores se unirem em favor de construir um modelo mais acessível e sustentável. Precisamos compartilhar nossas experiências e apontar soluções para uma indústria vital para o Brasil.
Segundo estudo da NewSense, sob encomenda da União Brasileira de Promotores de Feiras (Ubrafe), a cidade de São Paulo concentra 90% dos eventos do país, com 742 feiras e exposições por ano, reunindo mais de 8 milhões de visitantes e 66 mil expositores. Além da geração de emprego, esta atividade movimenta R$ 305 bilhões por ano, cerca de 4% do PIB nacional.
Esses números fazem deste apelo ainda mais urgente. Ainda estamos diante das incertezas que o Coronavírus lança sobre o mercado em geral. O Fórum Econômico de Davos, por exemplo, foi adiado para o verão do Hemisfério Norte, em data a ser definida. A maior feira de eletrônicos, a CES, apostou em evento presencial em janeiro de 2022, mesmo com a ausência de importantes patrocinadores. Uma das datas acabou sendo cancelada diante da preocupação com a nova variante.
Nós não podemos parar de novo. Não podemos voltar à zona de conforto. A nova ordem organizacional pede, claramente, agilidade, inovação e colaboração. Juntos, podemos reanimar esta indústria vital e entregar aos clientes, assim como aos demais stakeholders, uma experiência como nunca antes vista.
Somos milhões de profissionais que vivemos e sobrevivemos desse mercado, se não encontrarmos modelos sustentáveis para as relações Clientes/patrocinadores X Fornecedores/Organizadores e Centros de Convenções o impacto econômico e social será enorme.
Vamos enfrentar as conversas difíceis com coragem e vontade de solucionar?
No próximo dia 10 de fevereiro estarei no 2o Webinar Evento Único, onde o tema da vez será Feiras e Congressos - Vamos melhorar a vida do expositor?
O encontro colocará centros de convenções, promotoras, patrocinadores/expositores e montadoras em uma mesma conversa.
Espero que tenhamos um diálogo consciente e transparente para que possamos finalmente tirar este “elefante” da nossa sala!
* Amanda Lahmann é membro da Comunidade #Benchimice, Executiva da indústria farmacêutica, trabalha com eventos corporativos há mais de 25 anos.
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